Em seu artigo Sustainable Chemistry – A concept with important links to waste management (Química Sustentável – Um conceito com importantes ligações com gestão de resíduos), publicado em 2017, Henning Friege descreve a imensa abrangência deste novo campo e aborda os benefícios da integração da gestão de resíduos no conceito de Química Sustentável, para desenvolver soluções técnicas amplas levem em conta a reutilização e a recuperação de recursos.
O autor define Química Sustentável como um conceito abrangente que engloba o projeto, a fabricação e o uso de produtos e processos químicos eficientes, eficazes, seguros e ambientalmente benéficos, capaz de constutuir um instrumento importante para o atingimento dos Objetivos de Desenvolvimento Sustentávelg da ONU, incluindo um grande número de metas relativas a produtos químicos e resíduos.
A Química Sustentável pode se tornar uma contribuição valiosa no gerenciamento de resíduos, uma vez que a reciclagem de resíduos e a recuperação de frações de materiais em resíduos, frequentemente, são severamente limitados pela composição química dos produtos usados. Essas restrições incluem componentes perigosos, plásticos com diversos aditivos, materiais compostos que não podem ser separados adequadamente, bem como metais presentes em dispositivos eletrônicos.
A Química Sustentável busca maior eficiência dos recursos e aumento da utilização de recursos renováveis derivados de resíduos, sem pôr em risco a produção de alimentos; a utilização de substâncias menos tóxicas e mais degradáveis em condições naturais (“benign by design”) e o projeto de produtos que permitam a reciclagem, evitando combinações inseparáveis de materiais (“design for recycling”).
A globalização econômica levou à aplicação dos produtos químicos na maioria dos países, gerando uma disseminação global de resíduos, quando os produtos chegam ao seu “End of Life”. Há uma disponibilidade global de produtos químicos perigosos em resíduos que foram usados como ingredientes, constituindo um desafio para a gestão de resíduos em todos os países.
Entretanto, existem alternativas para superação dos obstáculos presentes: fabricação de produtos químicos com menos resíduos perigosos; síntese e utilização de produtos químicos menos perigosos e não persistentes no ambiente; e projeto de produtos considerando a recuperação de recursos após o uso (“design for recycling”).
Em relação à fabricação de produtos químicos menos perigosos e ambientalmente benéficos, existem algumas regras práticas introduzidas nos anos 90, conhecidas como “Princípios da Química Verde” que incluem a prevenção de resíduos na produção, a síntese direcionada maximizando a economia de átomos e o projeto de produtos químicos e materiais mais seguros e menos tóxicos.
A Química Sustentável foi desenvolvida a partir de um evento conjunto da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) e várias instituições alemãs (Agência Federal Ambiental, Instituto Federal de Segurança e Saúde Ocupacional e Ministério do Ambiente, Conservação da Natureza e Segurança Nuclear), intitulado International Workshop on Sustainable Chemistry – Integrated Management of Chemicals, Products and Processes, realizado em Dessau, no período 27–29/01/2004.
A Química Sustentável inclui a Química Verde como uma ferramenta para atuação no nível molecular, no estágio de síntese, explicando não apenas as funcionalidades de uma molécula que são necessárias para sua aplicação, mas também seu impacto e significância. nas diferentes fases do seu ciclo de vida, incluindo sua transformação em resíduos.
A OCDE define a Química Sustentável como “um conceito científico que busca melhorar a eficiência com que os recursos naturais são usados para atender às necessidades humanas de produtos e serviços químicos. A Química Sustentável engloba o projeto, a fabricação e o uso de produtos e processos químicos eficientes, eficazes, seguros e ambientalmente favoráveis.” Os textos a seguir refletem o atual “Estado da Arte” da Química Sustentável:
- Contribuição para um desenvolvimento positivo de longo prazo na sociedade, ambiente e economia. Por meio de novas abordagens e tecnologias, desenvolve produtos e serviços agregadores de valor para as necessidades da sociedade civil.
- Uso crescente de substâncias, materiais e processos com o mínimo de efeitos adversos possíveis. Além disso, substitutos, processos alternativos e conceitos de reciclagem são utilizados e os recursos naturais são conservados, para evitar danos e prejuízos para os seres humanos, ecossistemas e recursos naturais.
- Abordagem holística que estabelece metas mensuráveis para um processo contínuo de mudança, fundamentada na pesquisa científica e na educação para o desenvolvimento sustentável nas escolas e no treinamento vocacional.
Do mesmo modo que a Sustentabilidade, a Química Sustentável deve ser compreendida como um processo dinâmico, que pode constituir um instrumento importante para alcançar os Objetivos do Desenvolvimento Sustentável (Nações Unidas, 2015), incluindo um grande número de metas relacionadas ao uso de produtos químicos e gerenciamento de resíduos.
Integrados nesse processo estão a Abordagem Estratégica para o Gerenciamento Internacional de Produtos Químicos (Strategic Approach to International Chemicals Management – SAICM), sob a liderança do Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (PNUMA), bem como as Convenções Internacionais que abordam os produtos químicos e os resíduos perigosos.
A Figura 1, a seguir, mostra várias interseções da Química Sustentável com outras grandes questões do desenvolvimento global. Na visão de alguns estrategistas, os avanços da Química Sustentável dependem mais de novos modelos de negócios, do que de mais regulamentação, porque os princípios da Química Verde e da Química Sustentável economizam dinheiro no longo prazo e oferecem oportunidades não apenas para a indústria química, mas também para outros atores, ao longo da cadeia de valor.
Em relação a produtos químicos menos perigosos, padrões aprimorados de registro, notificação e regulamentação e o desenvolvimento de melhores tecnicas de avaliação das propriedades físico-químicas, toxicidade e degradação ambiental, provavelmente reduzirão o número de substâncias perigosas em aplicações futuras. Além disso, o avanço tecnológico pode ajudar a evitar substâncias potencialmente perigosas ainda em uso, como certos materiais de isolamento.
A produção desnecessária de resíduos e os riscos ocupacionais podem ser evitados pelo Chemical Leasing, que abrange diversos modelos de negócios que, com o apoio da United Nations Industrial Development Organization – UNIDO, têm sido aplicados com sucesso em vários setores, como petroquímica, química, indústria automotiva, indústria alimentícia, agricultura e hospitais, em diversos países.
No Chemical Leasing, o fornecedor vende as funções desempenhadas pelo produto químico. O serviço contabilizado por unidades funcionais (número de peças limpas, quantidade de área revestida, etc.) torna-se a principal base de remuneração. Este modelo de negócio fundamenta-se na minimização de resíduos, segundo uma perspectiva holística do ciclo de vida para estabelecer sistemas quase fechados, aprimorar o conhecimento entre os parceiros de negócios e incentivar o uso eficiente dos recursos em geral.
Contribuições significativas da Química Sustentável para menor produção de resíduos podem ser alcançadas pela aplicação das Melhores Técnicas Disponíveis (Best Available Techniques), como foi estabelecido para muitos setores da indústria na Europa. No projeto preparatório para o International Sustainable Chemistry Collaborative Centre – ISC3 (www.isc3.org), projetos de pesquisa, processos piloto e inovações já colocadas no mercado foram selecionados para definir abordagens pela Química Sustentável.
Na conclusão, o autor enfatiza que a implementação da Química Sustentável será uma tarefa prioritária do International Sustainable Chemistry Collaborative Centre -ISC3 (Centro Internacional Colaborativo de Química Sustentável), com o apoio do Governo Alemão. Acrescenta que o conceito de Química Sustentável deve ser encarado como um instrumento importante para abordar a agenda global para 2030, tendo os países em desenvolvimento maior potencial para aplicações.
O autor recomenda: continuar a desenvolver o conceito de Química Sustentável, com uma forte ligação aos resíduos e à gestão de recursos, ampliar a discussão sobre Economia Circular e integrar a gestão de recursos em cadeias de valor agregado inovadoras, de preferência em conjunto com empresas e especialistas do ramo de gestão de resíduos; e expandir modelos de negócios orientados a serviços, como o Chemical Leasing, a fim de manter o interesse na redução de resíduos como uma meta econômica e ecológica.