Há três anos, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) concluiu a reavaliação toxicológica do ingrediente ativo Paraquat (iniciada em 2008) e deliberou pelo banimento do produto. A partir disso, foi publicada a Resolução da Diretoria Colegiada (RDC) nº 177, de 21 de setembro de 2017, que dispôs sobre a proibição do ingrediente ativo Paraquat em produtos agrotóxicos no país e sobre as medidas transitórias de mitigação de riscos.
Com isso, no dia 22 de setembro de 2020, o ato normativo citado acima entrou em vigor, firmando a proibição da produção, importação, comercialização e utilização de produtos técnicos e formulados à base do ingrediente ativo Paraquat. Além disso, vale observar que, desde então, a RDC nº 177/2017 também estabeleceu medidas transitórias para diminuição dos riscos.
O Paraquat, classificado como um herbicida de contato não seletivo, é um defensivo agrícola de amplo espectro que serve, principalmente, para o controle de ervas daninhas em grandes culturas (como é o caso da soja). Além disso, também pode ser utilizado como dessecante. Pela análise química, o ingrediente é um composto de amônio quaternário, que pode ser encontrado em forma de sólido amarelo, com um odor característico leve de amônia.
Pode-se dizer que o Paraquat é um composto que possui grande importância toxicológica, uma vez que é associado à altas taxas de mortalidade. Relatos de humanos que ingeriram uma quantidade significativa de Paraquat denotam que a morte geralmente ocorre dentro de duas a três semanas, como resultado de insuficiência renal aguda, hepatite e, principalmente, insuficiência respiratória causada por inflamação pulmonar e fibrose.
Entre os riscos alegados de seu uso, e ainda em discussão no cenário internacional, estão a doença de Parkinson e a mutagenicidade (potencial de uma substância causar mutações que podem ser transmitidas, via células germinativas, para as gerações futuras, ou evoluir e causar câncer) nos trabalhadores que manipulam o agrotóxico. No entanto, vale destacar que a população em geral não está suscetível à exposição da substância por meio do consumo de alimentos.
Os sais de Paraquat apresentam toxicidade aguda moderada a alta entre as espécies, com os valores de DL50 orais variando entre 25 e 300 mg/kg. Os sintomas tóxicos da ingestão e inalação de pós incluem: cefaleia, náuseas, vômitos, diarreia, ulceração, dispneia e lesões pulmonares. A inalação de pós de tamanho não respirável pode causar irritação intensa e sangramento nasal; as exposições repetidas podem causar edema pulmonar grave e fibrose; e as poeiras são irritantes para o trato respiratório.
Atualmente, dentre diversos, pode-se citar alguns produtos comerciais dos quais o Paraquat pode ser encontrado: CYCLONE®; DEXTRONE®; ESGRAM®; GAMIXEL®; GRAMOXONE®; HERBIKILL®; HERBOXONE®; PARAMINE®; PILLARXONE®; UNIQUAT®; entre outros.
Recentemente, a Anvisa publicou a RDC nº 428, de 07 de outubro de 2020, que altera a RDC mencionada anteriormente (nº 177/2017), para tratar da utilização dos estoques em posse dos agricultores brasileiros de produtos à base do ingrediente ativo Paraquat para o manejo dos cultivos na safra agrícola de 2020/2021.
Com isso, foi alterada a data limite para uso do estoque remanescente de produtos agrotóxicos no país com o ingrediente ativo Paraquat. Com a nova norma, o prazo foi prorrogado, tendo sido condicionado à região e à cultura. Entretanto, ficaram mantidas as proibições de importação, produção, distribuição e comercialização.
A partir de agora, o prazo máximo de uso do estoque remanescente é 31 de julho de 2021, estratificado, podendo ser mais curto a depender da cultura e região:
CULTURA | REGIÃO (NORTE, NORDESTE, SUDESTE, SUL, CENTRO-OESTE) | PRAZO MÁXIMO DE USO DO ESTOQUE REMANESCENTE |
Soja | Centro-Oeste, Sul e Sudeste | Até 31 de maio de 2021 |
Algodão | Norte, Nordeste, Sul, Sudeste, Centro-Oeste | Até 28 de fevereiro de 2021 |
Feijão | Norte, Nordeste, Sul, Sudeste, Centro-Oeste | Até 31 de março de 2021 |
Milho | Norte, Nordeste, Sul, Sudeste, Centro-Oeste | Até 31 de março de 2021 |
Cana de açúcar | Norte, Nordeste, Sul, Sudeste, Centro-Oeste | Até 30 de abril de 2021 |
Café | Norte, Nordeste, Sul, Sudeste, Centro-Oeste | Até 31 de julho de 2021 |
Batata | Norte, Nordeste, Sul, Sudoeste, Centro-Oeste | Até 31 de março de 2021 |
Maçã | Sul, Sudeste | Até 31 de outubro de 2020 |
Citrus | Nordeste, Sul, Sudeste | Até 31 de março de 2021 |
Além da data limite para uso do estoque remanescente, outra mudança imposta pela RDC nº 428/2020 diz respeito ao recolhimento dos estoques dos produtos em embalagens de volume igual ou superior a cinco litros. As empresas titulares do registro desses produtos deverão recolher os estoques existentes em poder dos agricultores até 30 dias após o fim do prazo final estipulado.
Vale destacar também que o Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA) junto à Anvisa, publicou a Instrução Normativa Conjunta (INC) SDA-MAPA/ANVISA, nº 03, de 22 de outubro de 2020, que define os procedimentos para o monitoramento e a fiscalização quanto à utilização e ao recolhimento dos estoques remanescentes de produtos à base do ingrediente ativo Paraquat em posse dos agricultores brasileiros, para o manejo dos cultivos na safra agrícola 2020/2021.
Tal ato normativo providenciou o cancelamento do registro de produtos técnicos à base de Paraquat a partir da data de publicação da INC. Já os registros dos produtos formulados serão cancelados a partir de 31 de julho de 2021. Para entender melhor a diferença: os produtos técnicos são usados pela indústria para a formulação de defensivos e os produtos formulados são aqueles que já estão prontos para o uso.
Além disso, a INC também traz condições de uso do produto, para o gerenciamento de risco frente à exposição ocupacional, como a utilização de Equipamentos de Proteção Individual (EPI), o uso de tratores de cabine fechada que permita a aplicação do produto sem exposição do trabalhador rural e a utilização de sistemas fechado de lavagem dos equipamentos e embalagens. Contudo, é importante deixar claro que, apesar de o herbicida permanecer em uso por mais tempo, medidas restritivas foram e continuarão sendo adotadas para garantir a proteção dos trabalhadores, ou seja, dos aplicadores do produto que atuam no campo.
REFERÊNCIAS
AGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA – ANVISA. Paraquate: Anvisa mantém data para banimento.
AGÊNCIA NACIONAL DE VIGILÂNCIA SANITÁRIA – ANVISA. Paraquate: regras para uso do estoque remanescente.
CHEMICAL BOOK. Paraquat. Disponível em: Acesso em: 10 nov. 2020.
GOVERNO FEDERAL. Mapa cancela registro de produtos técnicos à base de paraquate. Disponível.
IMPRENSA NACIONAL. INSTRUÇÃO NORMATIVA CONJUNTA SDA-MAPA/ANVISA-INC Nº 3, DE 22 DE OUTUBRO DE 2020.
IMPRENSA NACIONAL. RESOLUÇÃO – RDC Nº 177, DE 21 DE SETEMBRO DE 2017. Disponível em: https://www.in.gov.br/materia/-/asset_publisher/Kujrw0TZC2Mb/content/id/19308145/do1-2017-09-22-resolucao-rdc-n-177-de-21-de-setembro-de-2017-19308065. Acesso em: 10 nov. 2020.
IMPRENSA NACIONAL. RESOLUÇÃO DE DIRETORIA COLEGIADA – RDC Nº 428, DE 7 DE OUTUBRO DE 2020.
NEVES, F. F. et al. Intoxicação grave por paraquat: achados clínicos e radiológicos em um sobrevivente. Jornal Brasileiro de Pneumologia, São Paulo, v. 36, n. 4, p. 513-516, ago./2010. Disponível em: Acesso em: 10 nov. 2020.
Giulia Forni de Almeida
Assuntos Regulatórios